quinta-feira, 22 de junho de 2017

Sede

por Matheus Campos

Todo ser possui diferentes versões de si a perambular pelos seus purgatórios.
Por outro lado, várias outras permanecem vivas e batalham por espaço em uma vida cada vez mais exígua.  Vivem com sofreguidão, mas vivem. Devemos nossa atenção a elas.
Há também algumas que são privilegiadas e só têm vontades banais. Não sofrem, não imploram por nada, não são excluídas. Aparentemente plenas, porém fracas. Qualquer coisa que não busca ou não necessita vai se enfraquecendo cada vez mais - até a existência ser somente o que já é por si só: existir. Ocupa-se o vácuo.
As nossas criaturas mais fortes são mesmo aquelas que estão vorazmente em busca de sobrevivência.
São os nossos vampiros sedentos. 
E entre eles ainda há a divisão: os que degustam o sangue e os que se alimentam dele com um instinto selvagem. 
O próprio sangue.
Aprendi a deixar que se alimentem do meu sangue, pois compreendo a sede. 
Compreendo também a satisfação. 
Das vezes que bebi doses quando a sede era de litros.
Do tempo que eu não me permitia me entregar à ausência e hoje, junto com a fantasia e a imaginação, ela me consome. E vampiros diáfanos me sugam. 
É natural. 
É tão natural que me rebelo quando tentam proibir que eu beba dessa fonte.
Sirva-se. 
Assim como não se ensina a respirar, não se ensina a beber: bebe-se. 
Só não pode ficar com sede.