por Matheus Campos
Até um tempo atrás eu
acreditava que a procrastinação era um mal terrível do mundo contemporâneo. As
distrações são muitas: redes sociais, netflix,
crises de existencialismo... E lá se vão horas e horas de pura ociosidade. O
pior é que sempre bate aquele peso na consciência de ter deixado o tempo passar
sem fazer nada de útil. Há uma sensação de falha, de agonia e de medo: o de não
conseguir mesmo sabendo que ainda é possível. Eu costumava pensar que o tempo –
metafísico e infinito – era como um inimigo imaterial em minha vida. Ou melhor,
o que eu faço dele.
Já não penso mais dessa
forma. Quer dizer, ainda acredito que o vício em fazer as coisas sob pressão
não é legal. O ato de postergar tarefas (“amanhã eu faço”, “outra hora eu
continuo”) é muitas vezes inerente a certa inconstância e impaciência, das
quais predominam em uma geração que quer tudo tão fácil e rápido. Na verdade, é
até mais conflitante do que isso. O fato é que quase sempre tudo parece muito
incerto. A gente acumula tantas informações sobre o mundo que nos permeia a
ponto de já não sabermos o que é realmente sonho ou ganância, o que é
necessário ou dependência, e nem quais são as expectativas dos outros ou
nossas.
Escrevo esse texto
pensando nos meus colegas do meio acadêmico e também profissional, muitos deles
indecisos e sem muitas aspirações na vida como eu. Certo dia conversei com
alguns deles sobre as dificuldades e inseguranças que temos. Tudo que consegui
sentir foi pena: de mim, de nós e de todos que estão sempre tão preocupados em
se preocuparem. Seja na faculdade, no trabalho ou em qualquer instância do cotidiano.
Em uma das minhas (várias)
distrações, me deparei com uma frase de um autor desconhecido que dizia o seguinte:
“A obrigação de produzir aliena a paixão de criar". Pois é. Eis uma
verdade irrefutável. Não dá para ficar produzindo compulsivamente. “Tenha
foco”, eles dizem. “Priorize o essencial”. O que é mesmo o essencial? E se eu preferir trabalhar com a inspiração?
Com meus instintos? E se eu achar fundamental tirar o dia para só comer e
dormir o dia inteiro? Ou beber uma cerveja com meus amigos. Caminhar sem rumo.
Ir ao cinema. Tanto faz.
Certa vez Chico Buarque
foi entrevistado por Clarice Lispector para o extinto Jornal do Brasil, em
meados de 1968. Quando ela perguntou sobre o seu modo de produzir, ele
declarou: “Às vezes estou procurando criar alguma coisa e durmo pensando nisso,
acordo pensando nisso – e nada. Em geral eu canso e desisto. No outro dia a
coisa estoura e qualquer pessoa pensaria que era gratuita, nascida naquele
momento. Mas essa explosão vem do trabalho anterior inconsciente e
aparentemente negativo”. Nunca me senti tão representado. Aposto que não sou o
único.
O que há de tão turbulento
na minha instabilidade entre o controle e o não querer? O que é o fútil senão
uma tentativa de sanar as dores da vida condenada à ordem? Por que não o prazer fugaz ao invés das
obrigações sistemáticas e contínuas? Será que há mesmo algo no tempo a se perder
senão a nós mesmos já perdidos sem saber?!
O que eu sei é que um dia tudo
será memória. E eu prefiro que a minha vá muito além das lembranças de uma
rotina mecânica e desgastante.